WALMOR CORRÊA, TELEPLASTIAS
Rosângela Cherem
Recorrendo a procedimentos como desenho e pintura, escultura e instalação, Walmor Corrêa recoloca uma relação de intimidade entre arte e ciência, que existe desde o amanhecer moderno, mas também problematiza as implicações atuais que nascem dos cruzamentos interdisciplinares e das indistinções entre realidade e ficção. Assim, suas obras se constituem num acontecimento em que as probabilidades da razão investigativa, sujeitas aos critérios de comprovação e demonstração, combinam-se com as possibilidades, incluindo aquilo que foi outrora tido como impossível ou permanece considerado plausível, foi um dia imaginado ou segue sendo sonhado.
O ponto a partir do qual se situa pressupõe um cientista (médico, antropólogo, botânico ou zoólogo) que viaja a lugares longínquos, recolhe e identifica, cataloga e estuda minuciosamente seus achados e descobertas, trazendo-os como vestígios ou evidências documentais. Ao remeter a diferentes geografias, existentes e projetadas, apresenta o des-local como premissa de cada um de seus trabalhos. Ao embaralhar as temporalidades em que os ramos do conhecimento foram formulados e suas especialidades legitimadas, faz com que as formas e as imagens possuam mais memória do que história. Perturbando a comprovação espacial e interrogando a linearidade cronológica, compõe e altera suas diversas séries através de uma combinação singular entre proximidade e distância, diferença e semelhança, confirmação e engano, revelação e disfarce.
Dito de outro modo, a poética deste artista parece colocar-se na contradança do tempo-espaço. Recusando o enclausuramento imagético, cria um mundo povoado por seres híbridos e improváveis, dotando-lhes de uma familiaridade que lembra os colecionadores de naturalias e artificialias, os proprietários de Gabinetes de Curiosidades e os frequentadores das Câmaras de Artes e Prodígios. Tal repertório, surgido no tempo em que as relíquias profanas trazidas pelos viajantes e comerciantes sobrepunham-se às religiosas, permite compreender que o conhecimento moderno nasceu assentado sobre um artifício destinado a encobrir os espantos e mistérios do mundo que se ampliava. Ao seguir neste encalço, o artista faz com que os seres inventariados, os corpos anatomizados e os esqueletos que jamais existiram funcionem como interrogação sobre o destino e o sentido da existência, carnavalizada como sobrevivência de um desvio e persistência de um deslocamento.
WALMOR CORRÊA, TELEPLASTY
Rosângela Cherem
Recurring to procedures as drawing and painting, sculpture and installation, Walmor Corrêa replaces a relationship of intimacy between art and science that exists since the modern arising, but also problematizes the current implications that are born in interdisciplinary crossings and in non-distinctions between reality and fiction. Therefore, his oeuvres are constituted in a happening in which probabilities of the investigative reason, subdued to confirmation and demonstration criteria, combine to the possibilities, including what was long ago considered impossible or belongs considered plausible, was someday imagined or follows being dreamed about.
The point from which is situated presupposes a scientist (medical doctor, anthropologist, botanical or zoologist) who travels to distant places, gathers and identifies, catalogs and studies minutely his findings and discoveries, bringing them as vestiges or documental evidences. In remitting to different geographies, existent and projected, presents the um-local as a premise to each of his works. In shuffling temporalities in which the branches of knowledge were formulated and specialties legitimated, it makes that the forms and images have more memory than history. Disturbing the spatial confirmation and questioning the chronological linearity he composes and alters his many series through a singular combination between proximity and distance, difference and similarity, confirmation and mistake, revelations and disguise.
Said in another way, the poetics of this artist seems to put itself in the counter dance of time and space. Refusing the imagistic closure, he creates a world populated by hybrid and improbable creatures, giving them a familiarity that reminds the collectors of naturalias and artificialias, the owners of the Wonder Cabinets and the visitors of the Chamber of Arts and Prodigies. Such repertoire, which arose in the time when the profane relics brought by travelers and merchants overlapped the religious ones, allows one to understand that the modern knowledge was born over an artifice destined to cover up the amazement and mysteries of the growing world. In following this path, the artist makes the invented beings, the anatomized bodies and the skeletons that never existed, work as an interrogation about destiny and the sense of existence, disguised as a deviation’s survival and persistence of a replacement.